Jurandir levantou as
mãos para cima, em um gesto de súplica. Mais uma vez ele fora escolhido para
ser o Papai Noel da festa que a família de sua mulher organizava para comemorar o Natal.
Desde o casamento com
Aurora, que sua sogra o elegeu como o bom velhinho. Agora, passados quase dez
anos, ele tentava se livrar desse encargo.
Novos genros foram
acrescentados à família, portanto, poderia haver um revezamento. Porém, dona Cotinha,
mãe de sua querida esposa, insistia na sua representação natalina. Ele sabia que
a nobre senhora, curtia vê-lo suando em bicas, vestindo aquela fantasia de
veludo, usando peruca e barba postiças. Havia também as botas, o cinto e as
luvas. Era uma forma de vingar-se dele,
o primeiro genro, o que casou-se com a sua filha favorita.
Além de vestir a velha
roupa vermelha, mofada e roída pelas traças, Jurandir, tinha que aturar as
brincadeiras dos convidados. E para finalizar a quente noitada, havia o saco
com presentes, que a cada ano ficava mais pesado.
Como se livrar desse
doloroso martírio: essa era uma questão que atormentava o Jura.
Mas este ano, o genro
sofrido pensou em algo que o livraria definitivamente desta obrigação.
Pensou em algo que
deixasse todos os convidados chocados e então sua sogrinha o expulsaria da
festa, assim ele estaria livre do
martírio.
Com a cabeça fervendo
no óleo da vingança, Jurandir aceitou tranquilamente o pacote com a surrada
fantasia de Noel.
Como de costume, no
dia da festança, sua mulher saiu de casa mais cedo, para colaborar na
organização da ceia. Seu esposo seguiria
mais tarde, dirigindo seu possante automóvel, um Passat verde, 1998, com o saco
de presentes no banco do carona.
Mesa posta, bebida no
gelo, crianças fazendo algazarra, som ligado e galera se esbaldando. Dona
Cotinha, correndo de um lado para outro, fiscalizava tudo. Genros, noras,
filhos e filhas, sobrinhos, netos, cachorro, periquito, vizinhos, papagaios
tudo misturado numa loucura maravilhosa. A sogra do Jura se orgulhava da festa
mais animada da comunidade. Sua casa ficava de portas abertas. Era confraternização
total. Sendo assim, o saco com os presentes este ano estava mais pesado, pois
além da família, havia também o presente para os filhos dos vizinhos.
Relógio marcando as
horas. O tique – taque dos ponteiros informando vagarosamente a chegada da meia
noite. Amigos, parentes, convidados e penetras cantavam “jingle-bell” na expectativa
da chegada do Jura, o Papai Noel.
As doze badaladas
foram ouvidas, todos emudeceram aguardando a entrada triunfante do bom
velhinho. Os minutos foram passando, as crianças começaram a chorar, os adultos
a comentar e dona Cotinha a se transformar numa cobra pronta para picar e matar
o genro.
A confusão deu lugar à
preocupação. Aurora, a esposa, chorava nervosamente. Uma das suas cunhadas, consolava-a, tentando fazer com que entornasse um copo de vinho tinto, tirado do
garrafão. Geladinho!
Após, quase uma hora
de espera, um convidado, que ainda estava lúcido propôs saírem à procura do “Juranel”,
que havia sido apanhado numa blitz da Lei Seca. Fora recolhido ao xadrez pelo
alto teor etílico em seu sangue, dirigir embriagado e desacato às autoridades.
Jurandir passou dois
dias na cadeia, distribuindo os presentes entres seus companheiros de cela, feliz
e longe da sogra. Seu plano saiu melhor do que ele havia imaginado.
Dona Cotinha foi
encontrada no telhado, tentando entrar na chaminé. Atualmente encontra-se numa
casa de repouso, Lar Noite Feliz.
Edison Borba
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