A
bota de um soldado encontrou-se casualmente com a sandália de um surfista.
Tentando uma aproximação e até uma futura amizade, fez observações sobre a sua
vida. Apresentou-se como patriota, contou das façanhas que havia praticado,
falou das batalhas e das guerras e da coragem que era preciso ter para
calçá-la. A bota considerava-se uma heroína, vencedora de grandes conflitos!
Passando
pelo local, o sapato de um empresário, parou para argumentar, na perda de tempo
daquela discussão, entre a bota e a sandália, que estavam jogando conversa fora
enquanto ele, se dirigia para a sua empresa. Ele sim era importante, trabalhava
num escritório, comandava diversas botinas de couro, algumas com buraco na
sola. Com ele, todos andavam muito o dia todo, todos os dias. Era necessário
produzir, mesmo causando calos nos pés que as calçavam, ao final de cada mês os
lucros subiam. Ele era lucrativo, portanto um grande herói!
O
bate - boca já se tornava intenso, quando uma saltitante sapatilha, que passava
no local pediu para dar a sua opinião.
A
linda sapatilha cor de rosa, fez uma pirueta e simplesmente afirmou: eu sou a
mais importante, porque represento a arte. Todas as noites uma plateia
maravilhada me aplaude. Sou famosa, faço as pessoas felizes, eu sou uma
heroína!
A
confusão já estava complicada, quando uma chuteira, parou o seu moderno
carro, e descendo até a calçada, pediu a palavra. Mandou que todos olhassem
para o seu veículo importado. Ela a chuteira, estava por cima, todas as
crianças, meninos e meninas, queriam calçá-la. Ela se tornara o símbolo da riqueza
e do poder. Até na moda já estava influenciando; cabelos eram moldados nos
salões de beleza por outros calçados que sonhavam em ser parecidos com ela. A chuteira,
vencedora de vários campeonatos, tinha status social, era rica e respeitada,
portanto era a mais importante, a verdadeira heroína!
E
assim a bota, o sapato, a sapatilha e a chuteira discutiam acaloradamente sobre
as suas importâncias. Quem tinha o poder e a fama? Quem reinaria como herói ou
heroína?
Sem que
os vaidosos percebessem, a sandália caminhou pela praia e mergulhou nas águas
azuis do oceano. Fez malabarismos entre as ondas. Flutuou na maré e voltou ao
local da confusão. Molhada pela salgada água, sabiamente falou: todos nós somos
importantes, desde que não pisemos nos outros calçados, não apertemos os pés de
quem nos usa, formando doloridos calos. Todos nós precisamos de pelo menos um
dia de liberdade para um mergulho no mar, num rio, numa piscina ou “piscinão”,
fazer um passeio no parque, gozando a vida sem medo e preconceitos.
Cada
um com sua utilidade e sem futilidade, pode gozar da felicidade que a liberdade
permite e da amizade de
seus companheiros!
Edison
Borba
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