sábado, 30 de outubro de 2010

ELIS ... ELA ... SE FOI ... REGINA!

Madrugada, TV ligada no canal dois. Quantas pessoas têm insônia e assistem a TV Educativa? Não devem ser muitas. Eu sou uma delas, e graças à falta de sono, pude vê-la e revê-la – Elis Regina.
Um programa feito de colagens, com diversos momentos deste “monstro” da música popular brasileira.
Ela canta, chora , ri, coloca a mão no rosto e fala dos seus sentimentos ... “meu coração tem uma dor que não cabe no mundo” ... e lá está ela cantando “Águas de Março”, ao lado do inesquecível Tom. Depois numa mesa de bar canta Iracema, com aquele sotaque  paulistano, do pessoal  do bairro do “Bexiga”, acompanha Adoniran Barbosa.
- “Iracema você “travessou” contra mão” – é um dos versos deste drama musical, que conta a história da jovem que às vésperas de se casar atravessou   a    São João na contra-mão. Morre atropelada, e seu noivo só tem de recordação o sapato desta mulher, pois até o seu retrato ele perdeu.
Somente Adoniran Barbosa sabia escrever versos engraçados para contar uma história triste. E somente a Regina sabia interpretar com graça esses versos, sem torná-los ridículos. Na sua voz essa história é simplesmente comovente.
Agora ela aparece erguendo os braços e gesticulando – canta “Gracias a la Vida”. Canta com o corpo, com a voz, com os braços. Diferente de Mercedes Sosa que tem uma interpretação mais contida.porém, a música mantém todo o seu vigor. “Gracias a la Vida” é um hino, como tantos outros que a Argentina Mercedes soube   cantar durante a sua luta contra a discriminação do povo latino americano.
A seguir Elis aparece vestida de baiana cantando “Aquarela do Brasil”.
Era sem dúvida nenhuma uma mutante. Conseguia passar da tragédia, para um samba exaltação mantendo a força das letras que só ela soube  recitar, tendo a música apenas como pano de fundo.
Mas meu coração bate forte, quando ela aparece na telinha, toda de preto e solta a voz em “O Bêbado e a Equilibrista”.
           - Caía a tarde como um viaduto ...
              A lua tal qual a dona de um bordel,
              cobrava a cada estrela nua um brilho de aluguel ...
              Que sufoco!
E nesta hora lembramos Henfil, a Graúna e o bode Orelana.
Que saudades do Pasquim! Que saudades da Elis!
Ela era, sem dúvida, uma mulher encantada, sofrida, confusa e apaixonante.
No palco – uma gigante imbatível!
             - Dança na corda bamba de sombrinha a esperança equilibrista ...
Somente ela soube dizer esses versos com emoção. E para entender essa emoção, é preciso ter vivido os anos da ditadura. Anos dos generais. Anos difíceis e sangrentos.
             E agora ELA surge cantando “Maria ... Maria”
             ... uma gente que ri quando deve chorar e não vive apenas agüenta ...
Versos tristes, mas que ela canta com uma alegria irônica1
             ... mas é preciso ter raça é preciso ter graça ...
             ... e ter a estranha mania de ter fé na vida ...
Agora ELA fala: - sou uma pessoa medíocre e tremendamente encabulada. Sorri, e começa a cantar uma antiga música carnavalesca:
              ... é com esse que eu vou ...
Nessa hora o seu sorriso é de uma menina encantadora !
              ... é com esse que eu vou sambar até cair no chão ...
Em outra cena seu rosto muda. O sorriso de menina desaparece e surge uma mulher sofrida :
- “eu não mudei ... foi meu disco que mudou ... minha vida está muito melhor ...
Se a sua vida estava melhor, eu não entendo a droga que a levou a morte!
Agora ela fala do bife acebolado que só a sua mãe sabia fazer, e da saudade que ela sente da sua casa .
O programa é uma colcha de retalhos. Foi editado com pedaços de entrevistas e shows que ela fez durante a sua tão curta carreira. E nesse emaranhado surge um cidadão de rua, ao qual um jornalista solicita uma pergunta para a Elis, e ele, sem pestanejar, diz:
                - “Elis você tem um sorriso tão bonito, eu gostaria de saber se seus dentes são naturais
                    ou se você usa dentadura?”
Ela gargalha, mas como sempre, repete o gesto de por as mãos no rosto demonstrando que continua a ser uma gaúcha tímida.
                  -“Estamos aqui de passagem” – ela diz ao jornalista
                  - “Isso aqui é um momento. A gente vem pra cá para melhorar. Eu acredito que voltamos”.
                  - “Se fosse só isso, nossa vida não teria sentido”.
Será que ela acreditava nessa teoria? Será que foi por esse motivo que não se preocupou em preservar a sua vida?
              Responde, e começa a cantar: “Manhã de Sol” – uma canção que fala do viver ...
... “é de manhã vem o sol e os pingos da chuva que ontem caiu
                                      ainda estão a brilhar” ...
Sublime! Sua voz cristalina nos faz sentir o brilho do sol  sobre as gotas que a chuva deixou ...
 - ... “um dia a gente acorda e o sonho acaba” ... é outra de suas frases, e começa a cantar
“Trem Azul” ... eu quero é pegar o trem e nunca ficar na estação. Não quero ver a vida passar, eu quero é ir  junto com o trem, não importa para onde ele vá!
Ela interrompe o jornalista e diz estar machucada, cheia de inseguranças, mas está viva, e fala dos filhos e diz:  ...” valeu bicho!”
Vou dormir pensando nesta Rainha Regina Elis que encantou e ainda nos encanta, quando a ouvimos cantar.
Em minha cabeça vem a letra de um dos seus sucessos:
                  ... “eu sou cantador, canto a vida e morte, canto o amor!” .
                                                                                                                     Edison Borba

Um comentário:

  1. Caros amigos - sou declaradamente um grande admirador da querida Elis. Sua voz, sua maneira de cantar. Seu gestual. Tudo nessa gaúcha me encanta. E foi para expressar o meu carinho pela Regina, que escrevi esse texto.
    Abraços Edison

    ResponderExcluir