Estou há trinta dias, envolvido com um controle alimentar
rigoroso. Eu, um guloso assumido estou redimindo-me de todos os pecados que cometi, e
não foram só os da gula. Estou
bravamente lutando contra os pudins de leite e os pães doces que, covardemente
acenam para mim, quando passo frente à vitrine das padarias. As cocadas se
juntaram com os caramelos e enviaram para minha casa um bilhete tentador. Estou
sendo abordado pelos implacáveis doces, que sem nenhuma piedade curtem o meu
desespero.
Semana passada,
mais precisamente na sexta-feira, ao entrar num restaurante, fui assediado pela
feijoada. Ela juntamente com seus acompanhantes, o paio, as linguiças, a carne
seca e até a couve, me abordaram descaradamente. Ao tentar me desviar desse
assédio, a laranja e a farofa, cercaram-me com propostas indecorosas. Consegui livrar-me
da situação, refugiando-me numa mesa bem no fundo do estabelecimento, abracei-me com as alfaces, as cenouras, o
chuchu e o agrião. E constrangido mastiguei vagarosamente todas aquelas cores,
e orando baixinho, pedi forças para resistir.
Porém,
o martírio ainda não havia chegado ao fim, dona feijoada, sentindo-se rejeitada, mandou
recado para a cozinha e os doces foram alertados. Um simpático garçom
estacionou ao lado da minha mesa, um carrinho repleto de pudins, geleias,
gelatinas, tortas e bolos. Não satisfeito, o bom homem fez questão de anunciar bem
alto a lista dos sorvetes. Era como uma tomada de frequência, os nomes eram
recitados um a um: sorvete de abacaxi, chocolate, morango, creme, manga, flocos
e por incrível que pareça, todos estavam presentes.
Suando frio, mesmo sem ter consumido os gelados, paguei a
conta e corri para a saída do restaurante, deixando o cafezinho abandonado
sobre a mesa ao lado do licor.
Corri para
casa, e me escondi em meu quarto. Aos poucos o sono chegou e adormeci
tranquilamente. Mas, após alguns minutos de relax, fui acometido por um
pesadelo; sonhei que estava num país, cujas ruas eram feitas de chocolate. Eu, deslizava pelas calçadas, parando em cada
esquina diante de postes de brigadeiros. As casas tinham
cocadinhas nas paredes e no jardim da praça, jorrava refrescos e sucos. Das árvores
podia-se colher quindins, cocadas, olhos de sogra, balas e os mais variados
tipos de bolos. Eu corri enlouquecido pelas ruas perseguido por vários
rocamboles e mousses. Cansado, desisti de fugir. Parei e fui abordado por um
lindo sonho com cobertura de caramelo. Cansado e sem forças, cedi à tentação e
abraçado àquele maravilhoso doce, acordei suado e com taquicardia.
Hoje fazem trinta e um dias que estou limpo, sem açúcar
no sangue. Meu estômago está livre de qualquer gordura. As mortadelas e os bolinhos
de bacalhau estão fora da minha vida. Os chopinhos e os vinhos deixaram a minha
casa. Sigo de mãos dadas com as alfaces, cenouras, beterrabas e couves. Estou cada
vez mais ligado ao integral arroz, um cara limpo e integralmente ético. Disse
adeus ao churrasco e a todos os seus acompanhantes. Sinto saudades da farofa,
grande amiga de tantos anos.
Estou em meu apartamento, solitário e tendo apenas como
companheiros os produtos “light”. São magros e sem graça, porém tenho que
conviver com eles por algum tempo, sonhando com meu retorno às rodas gordurosas
e deliciosas das tardes de sábado. Estou afastado do meu grande amor, o
brigadeiro. Há semanas que ele não me vista, porém o seu lugar em meu estômago
e coração nunca será preenchido.
Até lá,
estou tendo um caso, com as saladas e como amiga e confidente a simpática alface.
Edison
Borba
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