segunda-feira, 28 de novembro de 2011

APENAS UMA HISTÓRIA

É difícil contar a trágica história desse homem. Acredito que a palavra solidão possa ser usada para entendermos o seu drama. Não se trata da solidão do solitário,  ele era um cidadão trabalhador e cresceu rodeado de pessoas. Irmãos, amigos, colegas de escola e quando adulto, os companheiros de trabalho. O seu sofrimento cresceu com ele e se tornou um grande fantasma em sua vida. Talvez possamos comparar a sua trajetória, com a dos que sofrem diante dos espelhos.  Acreditando apenas  na imagem refletida, não conseguem ver nada mais do que distorções estéticas. Aceitam a cruel sentença imposta pela maldição do espelho, não  liberam o que de belo existe dentro de seus corações.
Fogem do convívio social, tornam-se solitários e dessa maneira, são facilmente envolvidos pela solidão. Acredito que foi exatamente o que aconteceu com Douglas.
Na infância foi  um menino diferente. Tinha os dentes proeminentes, que o fizeram receber o apelido de dentinho. Apesar disso, cresceu como todo garoto: empinando pipa, rodando pião e jogando bola. Na escola nunca foi brilhante, mas conseguia ser aprovado. Em casa, com seus irmãos mostrava-se gentil e carinhoso. Ainda que sofresse com o seu defeito na arcada dentária, era um menino dócil.
Cresceu carregando, no fundo de sua alma, as marcas das brincadeiras com que os colegas sempre o atingiram: dentinho! dentinho!
Aparentemente era um homem tranqüilo, porém estava sempre sozinho.
Quando alguma mulher tentava se aproximar, ele se afastava. Inventava histórias para justificar sua solidão. Aquele homem jamais tinha dado um beijo em toda a sua vida.
O tempo foi passando e ele vivendo uma vida sem graça. Dentinho! Dentinho! 
Palavras que ainda ecoavam dentro da sua cabeça, fazendo doer o peito.
Todas as manhãs, quando se olhava no espelho, sentia uma grande tristeza. Mesmo com belos olhos e um cabelo claro, quase louro, ele não conseguia ver nada de bonito no seu rosto.
Afastou-se da família. Não cultivava amigos. Apenas companheiros de trabalho, que ele descartava logo após o expediente. No refeitório refugiava-se na última mesa, procurando sempre comer com o rosto voltado para a parede.
Um dia ele não apareceu na fábrica. Seus colegas estranharam, pois  sempre foi um dos mais pontuais entre todos os operários.Após uma semana,  os vizinhos perceberam que havia um odor estranho vindo de sua pequena casa.
Chamaram a polícia.
Ao abrirem a porta, o encontraram caído no chão e com a boca aberta. Ao seu lado, um alicate. Dentro de uma lata estavam seus dentes. Pela primeira vez, banguela e já com o corpo rijo e arroxeado, ostentava um sorriso de felicidade.
Do livro – DOIS EM CRISE – de Edison Borba
Editora All Print / SP – 2010.
                                     


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