(por) Edison Borba
Na
sala do meu pequeno apartamento, exibo com orgulho um televisor de
trinta e duas polegadas, comprado nas Casas Bahia, através do meu
cartão de crédito, em dez parcelas sem juros. Já liquidei quatro,
faltam apenas seis. Que alívio!
Sinto-me
um cidadão feliz, sentado no meu sofá de três lugares, coberto por
uma linda capa colorida. Esse útil protetor de estofados foi
adquirido nas lojas C&A, onde usei meu anjo comprador, o cartão.
Custou uma bagatela, dividida em quatro vezes, sem juros. Só a
primeira parcela foi liquidada. Hummm! Preocupante!
Deslizo
pelo meu “apartamentículo”, e em cada cantinho, uma recordação,
uma saudade uma dívida a ser resolvida, uma parcela a ser quitada.
Na
cozinha, minha geladeira, orgulhosamente exibe um belo pinguim sobre
seu teto. Essa estatueta, foi presente de uma grande amiga,
Amelinha, que também é adepta, ou refém, dos cartões. Eu e
“Melinha” somos muito unidos, nas alegrias e nas prestações,
nos débitos e nos créditos. Compramos nas mesmas lojas! Nossa
amizade é tão forte quanto os nossos juros.
Faltam
apenas duas prestações para que a Brastemp, seja totalmente minha.
Guardo na gaveta o carnê de pagamentos, do Ponto Frio, o bonzão.
Conto os dias para não atrasar! Deus há de me ajudar não ter meu
nome incluído na lista de maus pagadores. Aleluia!
Sou
um cidadão realizado. Pago meu condomínio, com atraso de apenas um
mês, porém as contas de luz, gás e telefone estão sempre em dia.
Meu plano de saúde (ou será de doença) é resgatado pontualmente.
Vai que aconteça ...???? Nem pensar!!!
Sou
precavido, com saúde não se brinca. E para me manter sempre
saudável tenho liquidificador, espremedor de frutas, cafeteira,
torradeira e vários outros utensílios, adquiridos via internet em
parcelas, tudo no cartão de crédito. É apenas mais uma dor de
cabeça, suavemente suportável!
Estou
tentado a adquirir um novo computador, um note book e um tablet para
me manter atualizado. Todos os meus amigos já possuem esses
incríveis meios de comunicação. Eu não posso ser diferente. Quero
me manter em dia com milhares de informações que jorram pelas
telinhas destes demônios eletrônicos. Jesus!!!!!
Meus
três celulares já estão pagos. Mês passado, liquidei a última
parcela. Que felicidade poder ligar e ligar indefinidamente, usando
aquele plano de chamadas intermináveis. Graças aos comerciais,
entrei num plano sensacional, e agora posso conversar com o mundo!
Que maravilha ter amigos na China e na Sibéria.
A
conta telefônica? Essa também é interminável, mas sempre arranjo
uma forma de manter pequenos e planejados atrasos no pagamento. Deus
me ajuda a continuar fazendo ligações!
E
assim, vou vivendo de cartão em cartão. De parcela em parcela. De
atraso em atraso. Levando sustos, mas sendo um cidadão que não fica
parado no tempo. Eu sou um investidor! Sinto-me um empreendedor!
Invento desculpas. Crio soluções e mudo de cartões. Isso se chama
criatividade, ou será malandragem?
Meus
empréstimos reduzem meu magro salário, a um regime cada vez mais
cruel. Estamos, eu e ele, tão magrinhos, que qualquer dia,
entraremos para o Guiness Book.
Apesar
de todas as complicações financeiras, sou feliz! Tenho de um tudo
em meu lar. Trabalho a semana toda, e divirto-me nas noites de
sexta-feira, estico na Lapa, usando roupas de marca (qualquer marca),
pois o importante é acontecer e saber “cartonear”, isto é, usar
diversos cartões, pulando de operadora em operadora.
Tenho
vários tipos de cartões: crédito, débito, cliente especial e de
bancos. Esses deuses de plástico me ajudam a ser um cara descolado e
incluído em todos os ambientes desta cidade maravilhosa. Sou aceito
por qualquer tribo. Minha carteira está repleta de sonhos. Não
dependo das moedas e das cédulas, tenho mais vida e mais opções,
graças aos meus cartões.
As
dívidas vão rolando e rolando, enquanto em vou enrolando e
enrolando.
Bons
tempos os de hoje, em que um homem se faz pela quantidade de cartões
que possui e a capacidade de driblar as dívidas sem perder o bom
humor.
Cartão
é vida! Cartão é inclusão! Cartão é charme!
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