sábado, 7 de janeiro de 2012

KANYOMAR

Eis aqui uma história interessante. Nela encontramos a formação de um malandro, desde a infância e as possibilidades dele,  fazer carreira, na sofisticada malandragem da política. Mas, antes de chegarmos ao último parágrafo, a história sofre uma mudança radical. Esse giro de 360 graus fica por conta de uma mulher, a mãe do personagem principal. Outro ponto a destacar refere-se ao povo, que, quando quer, não faz papel de bobo.
Agora chegou a hora de conhecermos essa história.
Menino mirrado e marrento, Kanyomar era filho de Klaison e Marylísia. Aprendeu a ter orgulho do seu nome nas aulas de geografia, principalmente quando soube da existência de certa formação geográfica existente nos Estados Unidos. O menino sentiu-se grande, muito grande e também poderoso, e neste caso a presença do mar também ajudou na complementação psicocomportamental.
Na escola vivia constantemente na sala da direção. Em sua comunidade era um pestinha. Quebrava  vidraças, batia nos menores, chutava cachorro, entre tantas outras situações. Seus pais o apoiavam em tudo Kaninho (era dessa forma  que seus familiares o tratavam) seria um grande homem. Seu pai era seu grande incentivador e afirmava para os amigos que o filho ia ser um político.
Levando-se em conta a grande capacidade de criar complicações, sempre se dando bem, seu futuro sem dúvida seria a política. Sua mãe, muito protetora, sempre encontrava uma explicação para justificar as artimanhas do filho.
Na escola conseguiu chegar até a quarta série. Depois foi convidado a se retirar, o que fez com grande satisfação. Seus pais afirmavam  que não havia escola boa para seu guri. Ele era autodidata e o mundo seria o seu campo de aprendizado. Com certeza, Kaninho chegaria a ocupar uma bancada na política em seu país.  Até os 29 anos, nunca soube o que significava trabalho.
Vivia de arranjos. Arranjava uma mulher e lhe tomava a grana. Arranjava um trouxa e lhe tirava o salário. Arranjava confusão e carregava uma carteira.
Seu pai sempre acreditando que um dia ele ia arranjar um lugar na Câmara e nessa hora seu menino mostraria seu talento. Afinal já eram quase trinta anos de rigoroso aprendizado. Chegara o momento de lançar seu filho como candidato a qualquer coisa. Foi nesse estágio da vida de Kaninho, que os moradores de sua comunidade resolveram eleger um representante. Era hora de  apontar um líder que pudesse representá-los junto às autoridades. Essa idéia já estava sendo usada por outros grupos. Eles estavam sempre ouvindo nos noticiários a palavra dos líderes de comunidades.
Klayson e Marylisia viram chegar a grande chance para o filho galgar o primeiro degrau que poderia levá-lo (até quem sabe?) a um patamar qualquer.
Preparado, o garoto estava!
Era trabalhar na campanha. Fazer boca a boca com os vizinhos. Enaltecer os talentos do Kany (aqui seu codinome surgiu por aconselhamento de um amigo da família). Kany, nosso líder. Kany, o justiceiro. Kany, o fiel representante dos oprimidos. Kany, o nosso Robin Wood (este último foi sugerido por uma namoradinha que já tinha feito um cursinho de inglês e que estava “ficando” com o futuro líder).
Chegou o grande dia. Era o momento de coroar todo o sacrifício feito pela candidatura do Kaninho. Noites e noites organizando propaganda, panfletagem nos becos e ruelas da comunidade. Horas de caminhadas. E todo o dinheiro que a família e alguns amigos tinham conseguido juntar em poupança foi usado para o sucesso do Kanyomar.
Domingo de sol, todos às urnas. Depois um chopinho na laje. Um churrasco com pagode, mas antes era preciso votar. Não faltou ninguém. A comunidade consciente de seu dever democrático compareceu em peso. Até Lindinalva, grávida de nove meses, votou minutos antes de dar à luz a lindo menino.Na casa de Kaninho havia muita expectativa. Todos fizeram  bem o seu dever. Até foto do candidato abraçando velhinhos e rodeado de crianças foi colado nos muros. Aquela comunidade tinha que dar uma resposta favorável ao seu ilustre morador.
Encontraram Kanyomar, caído  na lama. Tinha enchido a cara num bar.  Nas urnas encontraram apenas dois votos, o dele e o de seu pai.
                Do Livro DOIS EM CRISE - de Edison Borba - Editora AllPrint / 2010.                

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