sábado, 3 de setembro de 2011

O MILAGRE

Jonas perdera o contato consigo mesmo. Uma redundância de vida. A maior parte de sua existência compunha-se de auto-enganos. Mais redundância. Desejava amar as pessoas, mas quando alguém se aproximava ele rejeitava o possível contato. Seu maior problema era a raiva, acumulada durante muito tempo. Ressentimentos não lhe faltavam. Não se permitia sentir qualquer coisa que pudesse significar amor. Passava o tempo todo remoendo sentimentos de ódio contra tudo e todos. Após um longo tempo vivendo em orfanatos, foi levado por adoção, por pessoas pouco afetivas. De sua família biológica nada sabia. A única imagem que ele guardava, eram as cinzas paredes do abrigo onde cresceu até completar nove anos. Sua adoção foi realizada de forma duvidosa. Entregue a pessoas inescrupulosas, nunca recebeu nenhuma forma de carinho. Durante anos foi obrigado a produzir sem nada receber. Mantido em cárcere, aprendeu a obedecer. Sua vida se resumia em trabalhar e trabalhar. O tempo passando e ele aceitando tudo com resignação. Nenhuma explosão. Nenhuma reclamação. Reprimiu sentimentos e silenciou. Ao se libertar desse cativeiro, aos dezoito anos, vagou por várias cidades, trabalhou em diferentes profissões, nunca criando raízes. Era um errante. Mudava de moradia, trocava de atividade, mas não se libertava dos tormentos. Fantasias incendiavam suas idéias, havendo momentos que sonhava com situações que não tinha vivido. Eram imagens que apareciam em sua cabeça, nascidas do seu imaginário. Entrava pânico isolando-se num fantástico e solitário mundo.                                                                                           
Celina era casada. Além dos serviços domésticos, acumulava tarefas atuando como voluntária num abrigo que acolhia moradores de rua. Foi nesse local que o destino agiu. Duas pessoas completamente diferentes. Produtos de mundos opostos se encontraram. Jonas e Celina. O andarilho e a dona de casa. A dama e o vagabundo. O amor e o desamor. Ele amargurado, solitário, tímido e virgem. Apesar de estar com mais de vinte anos, nunca tivera nenhuma experiência. Ela, mais de trinta, alegre esposa e mãe. Vida simples, equilibrada e insossa. Nunca tinha sentido o prazer de saborear uma fruta ácida. Celina jamais provara algo realmente excitante. Água com açúcar traduz  a rotina dessa mulher.
Jonas um homem de rua, procura abrigo e encontrou mais que sopa quente a agasalhos. Entre ele e Celina surgiu simpatia, afeição que se transformou em paixão. Tudo isso se manteve contido, escondido e reprimido por ambos. O clímax aconteceu, numa noite em que Jonas adoeceu. Com alguns conhecimentos de enfermagem, Celina foi indicada para cuidá-lo. E foram tantos ou cuidados, que Jonas curou-se de todos os males que o afligiam. Ela e ele experimentaram o mesmo remédio. O elixir de vida. O  néctar dos deuses. A vida de Celina jamais voltou a ser a mesma. Provar da limonada sem açúcar transformou a dona de casa numa nova mulher. Até onde sabemos, essa história tem um final “mega” feliz. Celina continua casada e transformou sua relação conjugal em algo apimentado e apreciado pelo marido. Jonas floresceu. Renasceu. Aprendeu o significado do amor e prazer. Aos poucos foi abandonando o silêncio e a solidão. Descobriu a possibilidade de ser feliz. Desnecessário dizer que a sua tensão emocional foi se esvaindo, dando lugar a uma sensação de plena liberdade. Um milagre! Se eles conseguiram, todos nós também podemos. É só ter fé!
Edison Borba

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