Lembro
perfeitamente bem, do dia em que ouvi pela primeira vez pleonasmo e anacoluto.
Foi paixão à primeira vista. Lindas palavras. Imponentes e
sérias elas ficaram na minha cabeça, após a aula de Língua Portuguesa.
Sai do colégio pensando como seria
magnífico encontrar um pleonasmo e se no mesmo momento pudesse fazer contato
com o anacoluto. Um sonho! O tempo
passou, e as esqueci até que um dia
esbarrei com o inusitado. Eu, um quase adolescente diante do inusitado! Diferente
das outras palavras, essa era intrigante. O que seria inusitado? Observei que me olhavam com admiração, quando eu a
pronunciava. Percebi que se tratava de algo que envolvia um grupo seleto de pessoas. Foram semanas
convivendo com o inusitado, mas gradativamente, fui perdendo o interesse e mais
uma vez busquei novos rumos. Certo momento, fiquei frente a frente com o
claustrofóbico. Impressionante! Alucinante! Pensei em me tornar um adepto dessa
estranha palavra, viver num claustro, adquirir
uma fobia e me transformar num claustrofóbico. Seria a realização de um sonho!
Teria respeito da sociedade. Todos me fariam reverência. Vejam, chegou o
claustrofóbico! Que palavra especial. Porém, aos dezoito anos, mudei meu foco e
me aproximei dos tentáculos. Passei a ficar horas a fio imaginando-me cheio de
tentáculos. Provavelmente seria confundido com um marciano. Minha foto sairia
nos jornais me garantindo o sucesso. E assim de palavra em palavra fui vivendo
num mundo de aventuras. O professor de ciências me presenteou com o artrópode.
Quando ouvi tal expressão, meu coração bateu forte, quase sufoquei: artrópode. A
força da sílaba “tró” é inebriante. Andava pelos corredores do colégio pensando
em viver como um deles. Habitar o seu mundo seria divino. Mas, um novo encontro
mudou meu destino. Outro mestre, outra aula e lá estava o icosaedro. Um
desafio! Na lousa a palavra gritava aos meus olhos: decifra-me! Uma sensação
estranha tomou conta de mim. Estava, pela primeira vez, sendo levado a buscar uma
solução. O que poderia ser aquilo? Na minha timidez, não solicitei ao
matemático a explicação. E vaguei dias a dias com aquela dúvida. Até que,
ouvindo um noticiário radiofônico o locutor nervoso, durante as informações,
bradou: deletério. Naquele momento, como num passe de mágica, encontrei uma
nova vontade de viver. Comecei a dançar e a pular, repetindo freneticamente:
deletério, deletério. Meus amigos não
entendiam, o porque de tanta euforia. Apenas eu e meu coração sabíamos
que um novo amor começava ali. Porém, minhas paixões são efêmeras e logo outras
palavras surgiram em meu caminho: ergoterapia chegou aos meus ouvidos pelos
lábiosde uma terapeuta. Na filosofia encontrei-me com a “prana”. Um viajante me
apresentou a Argóvia. E a medicina tem sido uma inspiração através de seus complexos
termos como agerasia, eletrocardiograma e masseter.
Palavras,
palavras e palavras! Um mundo mágico e instigante. Com elas ampliamos nossos
horizontes, podemos conversar horas e horas, mudando de assunto constantemente.
Tornamo-nos, verdadeiros opsômanos em busca de alimento.
Amigos,
por favor, não maltratem as palavras, não tirem delas o brilho e vigor. A
pressa do mundo moderno, obriga-nos a abreviá-las, e dessa forma, as mutilamos.
Como
é bom pronunciá-las, sílaba por sílaba, saboreando cada letra, como nos
ensinaram os queridos professores
alfabetizadores.
Edison Borba
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